Hipertensão Pulmonar: «maioria dos doentes apresenta-se nos centros de referência tardiamente»
Estima-se que, em Portugal, a Hipertensão Arterial Pulmonar afete cerca de 300 pessoas. No mundo, são mais de 25 milhões aqueles que sofrem de uma doença grave, sem cura e que, habitualmente, é diagnosticada em fases avançadas. Para ajudarmos a compreender a doença, começo por lhe perguntar em que consiste e quais as principais causas?
A hipertensão arterial pulmonar é de facto uma doença rara, mas grave que se caracteriza por alterações da vasculatura pulmonar que condicionam uma pressão nas artérias pulmonares mais elevada, dificultando a função do ventrículo direito em bombear sangue. Muitas vezes a causa é desconhecida e nesse caso definimos como hipertensão arterial pulmonar idiopática. Outras vezes pode ser hereditária ou associada a consumo de drogas, fármacos ou anorexígenos. Pode ainda aparecer associada a outras doenças como doenças do tecido conjuntivo mais conhecidas como doenças autoimunes, à infeção por VIH, a cardiopatias congénitas ou a doença hepática cronica com hipertensão portal.
Há, no entanto, causas menos comuns como a obesidade, por exemplo… Que causas são estas?
A obesidade pode por alguns mecanismos condicionar hipertensão pulmonar, mas não propriamente hipertensão arterial pulmonar que é já uma forma específica de hipertensão pulmonar. Normalmente a obesidade associa-se a síndrome de apneia obstrutiva do sono ou síndromes de hipoventilação que podem de facto condicionar hipertensão pulmonar.
Podemos falar em grupos de risco? A que outras patologias pode estar associada?
Podemos sim. Como disse na primeira questão, existem formas de hipertensão pulmonar que aparecem associadas a outras doenças. Assim sendo, podemos identificar as pessoas que tenham essas doenças como doentes de risco para hipertensão arterial pulmonar. Nestes casos o screening anual com ecocardiograma até pode estar recomendado como acontece por exemplo na esclerose sistémica. Devemos estar mais atentos ao aparecimento de sintomas nestes grupos de risco.
Sendo frequentemente ignorados, quais os principais sintomas da doença? Quais os sinais de alerta?
Os sintomas mais frequentes são a dispneia de esforço, ou seja, uma falta de ar desproporcional para um determinado esforço. Numa fase inicial da doença é para esforços intensos como subir lanços de escadas, mas à medida que a doença vai avançando a falta de ar surge para esforços progressivamente menores até causar franca limitação nas tarefas do dia-a-dia. Os sinais de alarme são sintomas que normalmente aparecem numa fase mais avançada da doença e se associam a gravidade como desmaio durante o esforço ou logo após o esforço, inchaço das pernas e/ou barriga, tosse com sangue ou angina de peito.
Diria que esta patologia pode estar subdiagnosticada? O que contribui para os atrasos no seu diagnóstico?
Eu tenho a certeza que esta doença está subdiagnosticada. Mais do que isso! A maioria dos doentes apresenta-se nos centros de referência tardiamente, ou seja, numa fase já avançada da doença. O principal motivo é o facto de os sintomas serem muito inespecíficos e facilmente confundidos com outras doenças cardiovasculares ou doenças pulmonares como asma, insuficiência cardíaca esquerda, DPOC. Outro motivo é a desvalorização destes sintomas pelos próprios doentes porque se instalam progressivamente e as pessoas vão-se adaptando, evitando subidas ingremes ou subir escadas.
A partir de que idade podem surgir os primeiros sintomas? E como é feito o seu diagnóstico?
Não existe uma idade para o aparecimento dos sintomas. Podem inclusivamente surgir durante a infância. Tudo depende da causa da hipertensão pulmonar. Quando hereditária ou associada a cardiopatias congénitas podem surgir ainda em crianças. Nas formas associadas a doenças do tecido conjuntivo por exemplo, é uma faixa etária mais elevada. Após a suspeita clínica o limiar para realização de ecocardiograma deve ser baixo, por ser um exame facilmente acessível e inócuo para o paciente. Se houver sinais suspeitos de hipertensão pulmonar no ecocardiograma, então o diagnostico deve ser confirmado, já nos centros de referência, através da realização de cateterismo cardíaco direito.
Em que consiste o tratamento? Em que casos está recomendado o transplante pulmonar?
Atualmente, a base do tratamento consiste na utilização de fármacos específicos que pretendem baixar a pressão nas artérias pulmonares – vasodilatadores pulmonares. É uma terapêutica específica, de utilização exclusivamente hospitalar e preferencialmente utilizada nos centros de tratamento que existem em Portugal e que estão definidos. O transplante pulmonar é uma estratégia de recurso para uma fase tardia da doença, em que a resposta ao tratamento com vasodilatadores pulmonares é insuficiente.
Quais os principais desafios nesta área?
Em primeiro lugar, eu diria que é o diagnóstico precoce: Reduzir o tempo que demora aos doentes a chegar aos centros de tratamento desde o início dos sintomas. Mas depois vêm outras formas de desafios relacionados com o facto de a hipertensão arterial pulmonar ainda ser uma doença cronica progressiva, sem cura. Seria bom aparecerem novos fármacos ou intervenções com intuito curativo que fossem verdadeiros modificadores de prognóstico.
Para aqueles que convivem com a doença, quais os principais cuidados a ter?
À semelhança da população em geral, devem adquirir hábitos de vida saudável: não fumar, comer bem, controlar o peso e evitar ter uma vida sedentária (salvo indicação em contrário). Depois há orientações específicas para estes doentes como a indicação para a vacinação contra a pneumonia, gripe e COVID-19. A gravidez está contraindicada na maioria dos casos e por isso em mulheres em idade fértil devem usar métodos eficazes de contraceção.
No âmbito do dia Mundial da Hipertensão Pulmonar, que mensagem gostaria de deixar?
Gostava de deixar uma mensagem de esperança. Esta é uma área com intensa investigação clínica, com inúmeros fármacos inovadores em teste, alguns aparentemente promissores. Em Portugal temos centros diferenciados com equipas multidisciplinares motivadas que todos os dias trabalham com vista a melhorar a prática clínica para que os nossos doentes possam ter acesso aos melhores cuidados de saúde.