As doenças cardíacas na gravidez
A associação entre doença cardíaca e gravidez é cada vez mais frequente. De acordo com os dados mais recentes até 4% de todas as gravidezes nos países ocidentais industrializados complicam-se pela existência de doença cardiovascular materna.
A doença cardíaca materna é a causa mais importante de mortalidade na grávida e não tem havido sinais de redução dos números de mortes por esta causa.
A correta estratificação do risco da gravidez, tendo em conta a doença cardíaca materna, e o seguimento por equipas médicas multidisciplinares especializadas tem um papel central e crucial neste grupo de doentes, de forma a reduzir a morbilidade e mortalidade materna.
Número crescente de grávidas com doença cardíaca
A doença cardiovascular é sem duvida um problema cada vez mais frequente na mulher grávida ou que pretende engravidar, e isso deve-se a vários fatores: ocorrência da gravidez em idade mais tardia, a uma maior prevalência de fatores de risco cardiovascular em mulheres na idade fértil (hábitos tabágicos, diabetes mellitus, obesidade, hipertensão arterial) e ao número crescente de mulheres com cardiopatias congénitas (CC) corrigidas que atingem a idade adulta.
A HTA na gravidez é a doença cardiovascular mais frequente (cerca de 10% das gravidas). Nos países ocidentais a cardiopatia congénita assume cada vez mais um papel de destaque (75-80%), enquanto que nos países não ocidentais, a doença valvular reumática é a que predomina (56-89%).
Como devem ser orientadas durante a gravidez
Importantes adaptações do aparelho cardiovascular ocorrem em resposta à gravidez (aumento do volume circulante, frequência cardíaca, débito cardíaco) para suprir as necessidades metabólicas crescentes da mãe e do feto. Alterações hemodinâmicas não adaptativas podem levar a morbilidade materna e fetal. A incapacidade de adaptação da grávida pode causar descompensação da doença cardíaca prévia, ser responsável pelo início dos sintomas ou levar à primeira manifestação de uma doença até então desconhecida, motivo pelo qual a gravidez é considerada por muitos como o "teste de stress natural".
Grávidas com doença cardíaca têm também maior risco de complicações obstétricas (parto pré-termo, pré-eclampsia, hemorragia pós-parto).
O seguimento e aconselhamento destas mulheres deve ser sempre individualizado, tendo em conta não só a doença cardíaca materna como também o contexto social e emocional, tal como os desafios éticos que tal implica; deve ser sempre feito por uma equipa multidisciplinar (“Pregnancy Heart Team”), incluindo não só os médicos assistentes, como também cardiologistas, internistas, obstetras e anestesistas dedicados a esta população de alto risco. A estratificação de risco (risco baixo vs contra-indicação para gravidez) é fundamental para a tomada de decisões e estabelecimento do plano de seguimento.
Idealmente todas as mulheres com doença cardíaca conhecida devem ser avaliadas antes da gravidez, de forma a que se possa aconselhar corretamente a mulher dos seus riscos e da probabilidade de sucesso para um feto viável, além de que uma vez decidido prosseguir para gravidez devem ser feitas alterações farmacológicas para fármacos que não estejam contraindicados durante a gravidez, pelo risco de malformações fetais
Contudo, muitas mulheres com doença cardíaca aparecem-nos grávidas, o que impõe mais riscos para a futura mãe e feto; nestas o tempo de gravidez será central para a tomada de algumas decisões, além de que possivelmente teremos que lidar com a malformações fetais consequentes de fármacos que deveriam ter sido suspensos antes da gravidez
Temos também os casos em que a doença cardíaca se manifesta pela primeira vez durante a gravidez, o que é ainda mais desafiante porque alguns exames complementares de diagnóstico não devem ser usados durante a gravidez pelo risco de malformações, alem de que novamente a introdução de vários fármacos considerados centrais para a mulher, poderão estar contraindicados
E, por fim, temos as doenças que são típicas da gravidez, como a pré-eclamsia, uma forma de HTA especifica da gravidez e a miocardiopatia periparto, uma forma de doença do musculo cardíaco que surge entre o final da gravidez e os primeiros meses pós parto, que requerem seguimento apertado durante a gravidez mas também no pós-parto porque podem deixar sequelas.
Mulheres que não devem DE TODO engravidar
Não devem engravidar as mulheres com doença cardíaca cujo o risco de morbilidade e mortalidade durante a gravidez seja considerado muito alto (40-100%), tais como: a hipertensão arterial pulmonar, a má função do coração (disfunção ventricular esquerda e/ou direita grave), as estenoses valvulares graves não corrigidas e a dilatação grave da aorta.
Qual a via de parto recomendada
O parto vaginal deve ser sempre privilegiado (menor risco de infeção, hemorragia, tromboembolismo); a cesariana fica reservada para as indicações obstétricas e casos especiais: mulheres sob anticoagulação oral, doença da aorta, insuficiência cardíaca descompensada e hipertensão pulmonar.