Internamentos sociais no SNS sobe 32% e devem custar mais de 124 milhões de euros ao Estado em 2022
Os internamentos inapropriados nas unidades hospitalares do Serviço Nacional de Saúde (SNS) aumentaram este ano, assim como os custos associados a estes casos que se explicam, na sua maioria, por atrasos na admissão na Rede Nacional de Cuidados Continuados Integrados (RNCCI).
Em março, estavam internadas de forma inapropriada nos hospitais portugueses 1.048 pessoas, o que traduz um aumento de 23% face ao mesmo mês do ano passado, quando os internamentos sociais totalizavam 853. Considera-se internamento inapropriado todos os dias que um doente passa no hospital quando já tem alta clínica e não existe um motivo de saúde que justifique a sua permanência em ambiente hospitalar.
Estes casos, que, à data da recolha dos dados (16 de março de 2022) representavam 6,3% do total de internamentos nos hospitais nacionais (excluindo unidades psiquiátricas), têm um custo estimado de quase 19,5 milhões de euros para o Estado, o que compara com 16,3 milhões em março de 2021. Extrapolando este cenário para o conjunto do ano, os internamentos inapropriados podem ter um impacto financeiro de cerca de 124,5 milhões de euros.
Estas são algumas das conclusões do 6º Barómetro de Internamentos Sociais, iniciativa da Associação Portuguesa de Administradores Hospitalares (APAH) – com o suporte da EY e o apoio institucional da Sociedade Portuguesa de Medicina Interna (SPMI) e da Associação dos Profissionais de Serviço Social (APSS) – que contou com a participação de 38 unidades hospitalares do Serviço Nacional de Saúde (SNS), num total de 19.335 camas hospitalares, correspondentes a 89% do total, a nível nacional.
Tal como o 5º Barómetro, cujos dados foram recolhidos a 17 de março de 2021, a edição deste ano realizou-se em contexto pandémico, pelo que também considera dados dos internamentos de doentes infetados, com as perguntas desagregadas em internamentos Covid-19 e internamentos não Covid-19. A recolha de dados para o Barómetro deste ano ocorreu durante a quinta vaga da pandemia, cerca de um mês depois de o Governo ter decretado o alívio de algumas restrições, tal como a recomendação de teletrabalho.
Os dados da APAH dão conta de um total de 31.311 dias de internamentos inapropriados (mais 8% face à 5ª Edição), um número que espelha o elevado impacto deste fenómeno no prolongamento da ocupação das camas em ambiente hospitalar, assim como o aumento dos tempos de espera para internamentos programados, resultando na degradação dos cuidados de saúde. Apesar do aumento do total de dias, a demora média nacional por episódio caiu face ao ano passado para 29,9 dias por episódio (33,6 dias em março de 2021).
No que respeita às causas dos internamentos sociais, a falta de resposta da RNCCI foi apontada como responsável por mais de metade dos casos, à semelhança das anteriores edições do Barómetro que pretende monitorizar e caracterizar este fenómeno crítico no sistema de saúde português e reforçar a importância do desenvolvimento de soluções conjuntas entre as diferentes entidades envolvidas, de forma a minimizar os impactos e melhorar o serviço de saúde.
Na mais recente análise, este fator explica 59% dos internamentos injustificados (67% no caso dos internamentos relacionados com a Covid-19), estando entre as principais causas referidas em todas as regiões do país. Lisboa e Vale do Tejo (34%) e Norte (47%) são as regiões com maiores taxas de internamentos inapropriados, sendo responsáveis, em conjunto, por mais de 8 em cada 10 casos de pacientes internados sem sintomatologia clínica que o justifique, confirmada através de alta médica.
Para Alexandre Lourenço, Presidente da APAH, “Os resultados da 6.ª edição demostram que voltamos a recuar nas respostas aos internamentos inapropriados face ao que ocorreu durante a pandemia em que ficou demonstrado que a saúde e a segurança social podem trabalhar juntas. Esta aprendizagem de trabalho conjunto deve servir de base ao desenvolvimento e consolidação de um novo modelo de governação que vincule todos os agentes na criação de soluções mais adequadas às reais necessidades da população, com vista à melhoria da qualidade e eficiência dos cuidados prestados, assegurando a dignidade dos cidadãos e a boa gestão dos recursos públicos.
“Os internamentos sociais são um excelente indicador do alcance social do SNS, e da sua missão mais abrangente na contribuição para o bem-estar dos seus utentes. O número de casos total aumentou face ao ano passado, sendo que no caso específico de doentes com COVID-19 desceu, o que aponta para um desafio estrutural. Com os investimentos previstos ao abrigo do Plano de Recuperação e Resiliência urge manter e intensificar a sua monitorização para aferir o seu impacto neste desafio alargado de saúde pública e social. Para a EY, participar na análise deste fenómeno é uma oportunidade para continuar a fazer parte da discussão de potenciais soluções para o mitigar, contribuindo assim para uma melhoria contínua do nível de cuidados de saúde em Portugal”, afirma Miguel Amado, Partner da EY.
Para Lélita Santos, Presidente da SPMI “As causas principais do problema foram já repetidamente identificadas e, sem dúvida, estão muito dependentes do setor social. Teremos particular interesse em saber como evoluiu o tempo de demora média dos internamentos inapropriados, se a resposta da RNCCI melhorou ou se foram desenvolvidas outras alternativas de apoio que retirem os doentes dos hospitais quando estes já não precisem. Sobretudo, todos temos interesse em melhorar a qualidade de vida dos doentes e este tipo de projetos facilita a procura de soluções e a melhoria dos índices identificados.”
“Confirma-se, uma vez mais, a importância do Barómetro para nos dar uma visão das limitações do país em responder, em particular, a dois fenómenos sociais: o envelhecimento da sociedade portuguesa e uma expressão cada vez maior de pessoas com problemas de saúde mental. Se a estes juntarmos as mudanças na estrutura familiar, temos um cenário que tarda em ter a atenção devida por parte do sistema de proteção social. Os dados do Barómetro indicam que foi feito um esforço de atuação conjunta Saúde/Segurança Social, no período da pandemia, com resultados positivos. Os tempos difíceis que vivemos têm de servir de aprendizagem, requerendo o alargamento no presente e no futuro das medidas adotadas, um novo modelo de cuidados e de proteção, um compromisso entre todos os agentes. Esta é a condição para a prestação de cuidados respeitadores da dignidade dos cidadãos e para a boa gestão das contas públicas”, conclui Júlia Cardoso, Presidente da APSS.