Pessoas com doença mental protagonizam espectáculos de teatro e dança
O evento, inserido no projecto Saúde Mental e Arte do Programa Nacional para a Saúde Mental, envolve mais de 400 doentes e 29 instituições e quer combater "o estigma", estando a arte ao serviço da reabilitação social dos indivíduos, sublinhou Álvaro Carvalho, director do programa nacional, durante a apresentação da programação de arte e dança das comemorações do Dia Mundial da Saúde Mental (10 de Outubro).
Nesse sentido, as criações que serão apresentadas têm de ser consideradas "como obras feitas por um cidadão", frisou, rejeitando uma diferenciação entre obras criadas por uma pessoa com doença mental ou sem doença mental.
Maria José Santos, de 52 anos, participa no grupo de teatro do Centro Hospitalar Psiquiátrico de Lisboa há nove anos, tendo sido diagnosticada com a doença bipolar aos 30 anos.
“Tive muitas perdas. A sociedade também não se compadecia com as fragilidades próprias da doença e pode até ser cruel com as suas regras”, contou, durante a apresentação do programa, salientando que mesmo com medicação sentia-se “estranha entre estranhos”.
Na iniciativa do centro hospitalar encontrou um grupo de teatro “coeso, especial, cheio de cumplicidades”, em que “espíritos inquietos” se entregam “por completo” ao teatro.
Lá dentro, “o encenador é um feiticeiro das palavras”, referiu, salientando que acabam “por se encontrar” e construir “uma identidade própria” através da arte.
João Maria André, comissário responsável pelas artes cénicas deste projecto, afirmou, durante a apresentação da programação, que “todos os cidadãos têm capacidade para exprimir a sua relação com o mundo e com os outros”, realçando que a arte tem a possibilidade de mobilizar quatro dispositivos: “o corpo, a consciência a memória e a imaginação”.
“Na doença mental, há problemas com estes quatro processos” tendo a arte uma “dimensão terapêutica incontornável”, explanou. Segundo João Maria André, esta iniciativa também é uma forma de mostrar “ao poder político que vale a pena investir nestes processos”. Leonor Barata, responsável pela componente da dança, notou que pessoas com doença mental estão, muitas vezes, “condenadas ao silêncio e a uma expressividade funcional”, podendo a dança, e a arte no geral, “penetrar neste contexto” e contribuir para “uma sociedade mais feliz”.
Os espectáculos serão exibidos no Teatro Académico Gil Vicente, no Teatro da Cerca de São Bernardo, no Instituto Português da Juventude e no Teatro Loucomotiva.
Para além da dança e do teatro, o projecto engloba ainda a exposição de obras de pintura e escultura de mais de 100 artistas com doença mental, que estarão em cinco espaços de Coimbra.
A iniciativa terá expostas as obras no átrio do Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (12 de Setembro a 10 de Outubro), no Museu Nacional Machado de Castro (03 de Outubro a 12 de Outubro), na Casa Museu Bissaya Barreto (08 de Outubro a 24 de Outubro), no Museu da Ciência (10 de Outubro a 05 de Janeiro) e na Casa da Escrita (03 de Novembro a 30 de Novembro).