Plataforma inovadora pretende combater falta de dados sobre cancro hereditário em Portugal
A falta de dados é o ponto de partida. “Sub-identificamos os portadores de alterações genéticas (atualmente só 20% a 30% dos portadores estão identificados), as opções de reprodutivas são mal abordadas e a resposta no sistema nacional de saúde é muito fraca”, afirma. A estas razões juntam-se “tempos de espera inaceitáveis para o aconselhamento genético, o resultado do teste e as cirurgias preventivas (as pessoas ficam doentes à espera da sua prevenção), há uma falta tremenda de recursos (a prevenção representa 1% a 2% do orçamento do estado) e a falta de literacia genética na sociedade médica e civil é muito elevada”, o que reforça a necessidade de uma plataforma como a EP.
Marta Amorim, Genética Médica nos Lusíadas Lisboa, realça a importância do conhecimento do risco hereditário, que “permite a adoção de medidas de vigilância, prevenção e profiláticas ajustadas ao risco específico de cada utente. Como estas síndromes são responsáveis por cancros jovens, permitem-nos salvar vidas, porque estaremos a rastrear uma população (jovem) que habitualmente não faria vigilância e correria o risco de desenvolver um cancro inoperável no momento do diagnóstico”.
É por isto também que, reforça Tamara Milagre, nasce a EP, “uma ferramenta que ajuda a orientar as pessoas interessadas na eventual necessidade de realizar um aconselhamento genético, podemos inclusivamente oferecer o mesmo, encurtando dramaticamente o tempo de espera”. E oferece ainda apoio psicológico. “O utilizador só precisa de ir à agenda do respetivo profissional de saúde e marcar nas datas disponíveis.”
Adicionalmente, dará ao doente a possibilidade de armazenar todo o processo clínico na plataforma, ultrapassando a barreira da não interoperabilidade dos sistemas hospitalares “e constante falta de informação complementar ou que leva à duplicação de exames e análises. Além de informação personalizada, oferece ao utilizador outras funcionalidades para uma melhor gestão da condição ou da doença, como se fosse um assistente pessoal de bolso. Também terá agenda, lembretes e a possibilidade de participar na investigação por consentimento informado”, explica Tamara.
Além do doente, a plataforma disponibiliza outros dois perfis de utilizador: o profissional de saúde, que pode ter um espaço de comunicação com o seu doente, e o investigador, que terá possibilidade de auscultar os utilizadores que deram o seu consentimento informado sobre as suas necessidades reais mais urgentes. Tudo isto garantindo, segundo Tamara, “o máximo cuidado para proteger os dados pessoais do utilizador. Ele é o administrador dos seus dados e nada acontece sem dar o seu consentimento informado, como também poderá eliminar o seu perfil e a informação quando o desejar”.
Os benefícios são: “para o utilizador saudável, ou para os doentes, vai aumentar, de forma personalizada, a sua literacia em saúde, o que ajuda na melhor gestão da sua condição e pode avaliar a necessidade de se aconselhar com um médico geneticista. Além disso, tem consultas de psicologia e de aconselhamento genético na plataforma. Também pode centralizar o processo clínico nesse espaço e terá uma ‘sala’ onde pode escrever uma espécie de diário para o médico, podendo ainda informar-se sobre ensaios clínicos em recrutamento e obter um resumo, em linguagem leiga, de qualquer relatório médico ou informação clínica.”
Para os profissionais, oferece a possibilidade de acompanhamento do doente “em proximidade, continuidade e detalhe, rentabilizando tempos de consulta. A teleconsulta é uma forma sustentável dos cuidados centrados no doente, pois encurta o tempo de espera e aumenta a resposta e uma intervenção precoce e previne complicações indesejadas”.
No que diz respeito aos cancros hereditários, sabe-se, confirma Marta Amorim, Genética Médica nos Lusíadas Lisboa, “que cerca de 10% dos cancros são familiares – existe uma variante genética (monogénica) que predispõe para cancro herdado. Dependendo do gene, a presença dessa variante pode aumentar a probabilidade da pessoa desenvolver cancro ao longo da vida em vários pontos percentuais. Por exemplo, uma variante patogénica nos genes BRCA1 ou BRCA2 confere um risco de cancro de mama superior a 50%, em vez dos 12% na ausência da mesma”.
No que diz respeito à oferta de tratamentos, a médica refere que Portugal está em linha com o que existe no resto da Europa. Mas deixa um alerta: “faltam sobretudo recursos humanos que permitam a necessária organização em consultas multidisciplinares. Uma pessoa identificada com uma síndrome destas irá necessitar de um acompanhamento polivalente (envolvendo especialidades médicas como oncologia, cirurgia, radiologia e genética médica, não médicas como psicologia, apoio social, etc), especializado (com experiência na área), articulado (que reúna e discuta os casos e os vários desafios que surgem nestas síndromes) e próximo, para que possa beneficiar da identificação desta predisposição”.
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